Considerar ou Afirmar?

Ah, os textos… sabemos que “ler” textos não é a “preferência nacional”, mas convenhamos, a leitura é absolutamente necessária e uma boa interpretação algo imprescindível.

Algumas matérias podem realmente ter um grau de dificuldade maior do que outras em termos de entendimento e aprendizado. Isso é absolutamente normal. Mas nos dias atuais, parece que até mesmo as coisas mais simples podem gerar uma imensa confusão.

Este pequeno artigo surgiu de algo inusitado e até engraçado, mas realmente preocupante pois demonstra uma profunda dificuldade de compreensão e até mesmo raciocínio lógico por parte de algumas pessoas.

Em inúmeras publicações sobre óptica geométrica, encontramos as seguintes frases: “Os raios solares que chegam à Terra podem ser considerados paralelos” – “Podemos considerar os raios solares paralelos” -“Devido à distância do Sol em relação à Terra, consideramos os raios solares paralelos”

Isso tem gerado uma imensa discussão por parte de algumas pessoas que acreditam ter encontrado uma “contradição” na física da óptica geométrica, já que sabemos que raios paralelos (absolutamente paralelos) não criariam umbra e penumbra, o que no mundo real não é o que acontece, vide o exemplo de eclipses lunares e solares.

A sustentação para essa afirmação é, infelizmente, a interpretação totalmente equivocada de uma frase e visível desconhecimento de vocabulário, não uma “descoberta” de um pote de ouro no final do arco-íris.

Caros amigos, considerar NÃO É afirmar.

Primeiro vejamos alguns sinônimos do verbo “considerar”:

  • Pensar
  • Refletir
  • Ponderar
  • Cogitar
  • Matutar
  • Especular
  • Pressupor

Agora vamos a alguns exemplos:

Pedro diz: Eu me considero um cirurgião

Paulo diz: Eu sou um cirurgião.

Analisando de modo sintético as duas frases, qual dos dois realmente é o cirurgião?

Acredito que a interpretação é óbvia: Paulo é o cirurgião, pois ele afirma isso.

Pedro apenas cogita, pressupõe; especula ser um cirurgião. Fácil não é?

Outro exemplo:

O número 0,0001 pode ser considerado Zero? Bem, em uma análise rápida, se um valor tão baixo não tiver relevância em algum cálculo proposto, sim, 0,0001 pode ser considerado Zero.

Agora, 0,0001 é Zero absoluto? Claro que não.

E a questão dos raios solares?

O Sol é uma fonte extensa, com diâmetro de aproximadamente 1,391 milhões de km e encontra-se à uma distância média de 149,6 milhões de km do nosso planeta. Portanto em um cálculo rápido para fontes extensas, encontramos uma divergência total entre os raios na ordem de 0,53º. Então, sabemos que os raios solares que incidem em nosso planeta não são absolutamente paralelos.

Vejamos: 0,53º é “Zero”? Não.

0,53º pode ser considerado “Zero”?

Novamente, como no exemplo anterior, dependerá do cálculo proposto.

Para uma grande quantidade de cálculos cotidianos mais simples, onde os 0,53° não possuem influência significativa, sim, este valor pode ser considerado “Zero” e consequentemente os raios podem ser considerados paralelos. Vejamos alguns exemplos:

  • Instalação de painéis solares fotovoltaicos
  • Instalação de painéis solares para aquecimento de água
  • Construção de dessalinizadores solares simples
  • Construção de desidratadores solares
  • Verificação de posicionamento de construções para escolha de áreas de incidência solar e sombras projetadas
  • Exercícios didáticos como medição de comprimentos de sombra projetada e semelhança de triângulos (descobrir a altura de um poste por exemplo)
  • Experimentos simplificados com lentes, prismas e espelhos
  • Verificação de azimutes solares, períodos de iluminação e intensidade, etc

Para todos os exemplos anteriores, o “erro” causado por se considerar os raios solares paralelos, seria algo na ordem de +-1%. Um valor totalmente aceitável e sem nenhum tipo de consequência séria para os resultados.

Agora, obviamente, existem casos que não podemos considerar os raios solares paralelos, (já que eles possuem o valor de divergência total na ordem de 0,53º e este valor deve obrigatoriamente entrar no cálculo), caso contrário os resultados apresentarão erros muito elevados. Vejamos os exemplos:

  • Cálculos astronômicos para observação de eclipses lunares e solares
  • Cálculos astronômicos para certas observações específicas de satélites artificiais, estações orbitais e outros objetos
  • Cálculos para simulação precisa de futuros eventos astronômicos
  • Experimentos mais complexos de óptica geométrica que utilizem luz solar
  • Projetos arquitetônicos que envolvam iluminação natural como claraboias, vitrais, recortes na estrutura, ou qualquer outro recurso que desempenhe função geométrica específica para um determinado resultado final.
  • Grandes painéis solares ou espelhos, onde a geometria focal tem maior precisão

Acho que ficou muito clara a diferença entre CONSIDERAR algo, e AFIRMAR algo não é?

Portanto, vejam que uma interpretação equivocada de um enunciado, pode até mesmo fazer certas pessoas sonharem com um Nobel, mas infelizmente ainda não será dessa vez que isso vai acontecer.

“Os novos “questionadores” infelizmente não estão buscando respostas. Na verdade, estão buscando afirmações que sustentem o seu próprio engano.”